O controle

Publicado em Contraciv

Civilização é sobre controlar violentamente a natureza, porque a civilização se percebe como vítima de um controle opressivo da natureza. Mas é realmente possível controlar a natureza sem colocar em risco nossa própria natureza?

Ter o controle sobre sua própria vida é um pressuposto para a autonomia. Mas controlar outros para obter poder diminui não somente a liberdade do controlado, como também a autonomia do controlador, que se torna dependente desse controle. As necessidades naturais são muito poucas, elas preservam a autonomia em ambos os lados da relação. As necessidades artificiais se acumulam, crescem na medida em que a sociedade se complexifica, invertem os mecanismos de limitação e geram relações abusivas.

Toda questão recai sobre a distinção entre os limites da ação humana e da ação dos demais seres, ou seja, do meio. A civilização vive sob a ilusão de que obter um controle maior sobre o meio (os agentes externos) produz necessariamente uma autonomia maior, uma emancipação humana. Mas a natureza sempre encontra um meio de reequilibrar a relação, colocando o homem no seu devido lugar. Nossa relação abusiva e opulenta com a natureza irá eventualmente chegar a um limite. A civilização chama isso de “fim do mundo”. Ela teme isso mais do que qualquer coisa.

A crença no controle nos distingue de todo resto dos seres vivos deste planeta, incluindo os grupos humanos que permaneceram fora do jogo civilizado. Achamos que podemos obrigar os seres a cumprirem o papel que nós damos a eles. Não fugimos do controle opressivo, nós o criamos. A ânsia de se livrar das limitações naturais nos fez perder a capacidade de distinguir entre ações livres e ações condicionadas. A perda dessa distinção é a origem da nossa crise de identidade. Não sabemos mais quando estamos sendo nós mesmos.

Nosso inimigo é a ilusão de que devemos governar o mundo.

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